Sunday, December 08, 2013

Soyez les bienvenus

O estrangeiro que desejar conhecer Joinville não se decepcionará. Trata-se de uma cidade onde tudo e todos estão em seu lugar, cada morador também sabe qual seu papel dentro da organização social. Além disso, existem inúmeras atrações turísticas e belezas naturais dignas de nota, sem falar no efervescente cenário cultural em constante atividade. Claro, existem alguns pequenos inconvenientes, nada de muito grave, mas que deve ser anotado, para não se criar a falsa expectativa de um lugar absolutamente perfeito.
Primeiro vamos às principais qualidades para, ao cabo, enumerarmos seus poucos inconvenientes.
Uma cidade, todos sabemos, não é feita apenas de praças e monumentos (abundantes em Joinville), mas principalmente por seu povo e isto é o que há de melhor em nossa terra. Como dito no introito, cada qual sabe lugar e seu papel e todos são muito ordeiros e trabalhadores e principalmente, do Bem. Se não vejamos: trata-se de uma cidade próspera, a maior e mais rica de nosso estado, mas ainda assim alguns elementos (poucos) insistem em manterem-se alheios à esta pujança, são moradores de alguns bairros mais afastados. Não obstante à sua falta de iniciativa e esforço para compartilharem da prosperidade citadina, estes indivíduos, ao menos sabem seu lugar e acham por morar uns próximos dos outros, em locais afastados do centro, deixando a cidade mais bonita, sem que o estrangeiro se depare com casas desleixadas e tipos molambentos.
Outro exemplo gritante da ordem do nosso povo diz respeito aos protestos populares. Ao longo da história muitos foram os levantes populares e muitos desses culminaram com o engrandecimento da nação, como no exemplo francês. Aqui não poderia deixar de ser diferente, quando o povo não se sente plenamente representado pelas autoridades que receberam seu voto no sufrágio universal, saem às ruas para exigir seus direitos de cidadão. Isto enriquece a democracia e fortalece a cidadania, mas tudo tem um limite, pois os manifestantes jamais ocupam ruas e praças públicas sem antes pedirem a autorização dos órgãos competentes e o auxílio da polícia. Os órgãos competentes concedem, então, um alvará para a realização da manifestação, que terá hora e local previamente determinados para começar e terminar. Já a polícia, fará a sinalização das ruas, afim de evitar congestionamentos no trânsito e aborrecimento aos motoristas alheios aos protestos. Finda a manifestação, cada um segue ordeiramente para sua casa.
Temos dois luxuosos teatros, erguidos pela iniciativa de nossos governantes, com recursos públicos muito sabiamente empregados: um para eventos esportivos, outro para culturais. Sendo ambos públicos, o acesso do povo é irrestrito, devendo apenas, em dias de espetáculos, o espectador pagar um módico ingresso, para fins de manutenção do local e custear a atração ora apresentada. Assim, com cerca de meio salário mínimo, uma família composta por pai, mãe e um filho, poderão ir à vontade, sempre que tiver uma atração esportiva (o futebol é deveras apreciado), ou uma das tantas peças teatrais que jamais deixam de perfazer o eixo Rio-São Paulo-Joinville. No nosso teatro, ocorre ainda o maior festival de dança do mundo, prestigiado por toda a população que se envolve de maneira exemplar e prestigia cada apresentação. Ninguém, nem mesmo os moradores das zonas mais distantes ficam alheios a este mega-evento cultural. E como de costume, qualquer um pode prestigiar as apresentações, pagando o tradicional módico ingresso.
A natureza também nos favorece e a ela prestamos sempre nossa reverência e respeito. Exemplo disso é a sede do poder local, a prefeitura, erguida às margens do nosso principal rio, o Cachoeira. Todo visitante que for à prefeitura poderá perceber nosso zelo, pois ao longo das margens do rio, além da própria prefeitura, erguem-se monumentos, praças, calçadões, tudo para homenagear aquele que foi o primeiro caminho por onde vieram nossos Ancestrais Europeus.
Também somos muito bem servidos no que tange a alta gastronomia, não devendo nada aso principais centros europeus. Muitas sãos as opções, desde o tradicional churrasco, passando por comida japonesa, italiana, chinesa, grega (nosso arroz à grega é mundialmente famosos), árabe, francesa e internacional. E tudo muito acessível a todos os bolsos. Aquela família que foi ao tetro, após o espetáculo poderá jantar, como se no Velho Continente estivesse, gastando pouco menos de meio salário mínimo, ou seja, poderá enriquecer imensamente o espírito e satisfazer a carne plenamente, sem precisar comprometer seus rendimentos mensais.
Apesar de tantas oportunidades de acesso aos eventos culturais e gastronômicos, muitos ainda mantêm-se arredios em saírem de seus bairros, preferindo manterem-se distantes do centro, o que não é de todo ruim, pois evita que se agrave o já preocupante número de congestionamentos no trânsito.
Preocupado com alguma possibilidade de o povo não participar ativamente dos eventos da cidade, o poder público, para as festas de Natal, montou uma suntuosa decoração com motivos natalinos, em um local estratégico: bem ao lado do terminal urbano de ônibus. Estratégico pois fica em uma ampla e bela praça, e como dissemos, ao lado do terminal de ônibus, além de ser de acesso inteiramente gratuito. Para ver as maravilhas que ali foram instaladas, qualquer família pode pegar o ônibus e, a poucos passos do desembarque poderá ver bonecos de neve, caixas coloridas, Papais Noel, um presépio, tudo ao ar livre. O sol escaldante de dezembro diminui um pouco o afluxo de visitantes durante o dia, mas à noite, as constantes chuvas de verão refrescam o local e permitem maior conforto para a população.
No local encontramos também, uma completa praça de alimentação, composta pelas mais variadas ofertas de guloseimas e petiscos: pipoca, algodão doce, espetinhos, milho cozido, morango com chocolate e muito mais. Como a visitação é gratuita, todos podem saborear sem preocupações monetárias as delícias oferecidas por verdadeiros chefs da cozinha popular.
Vale destacar, ainda sobre a decoração natalina, outro aspecto do local pensado em todos os detalhes. Falamos en passant dos ônibus. Pois bem, como descrito, a praça fica ao lado do terminal urbano, e além dessa estratégica proximidade, temos um serviço de transporte coletivo dos melhores do mundo, além de muito barato. Qualquer um pode ir a qualquer lugar da cidade, sempre com muito conforto e rapidez, pagando apenas uma simbólica passagem. Ou seja, não existe desculpa para que todos participem ativamente dos eventos da cidade. Afinal, permitir que mesmos os moradores das áreas mais afastadas do centro se desloquem para qualquer lugar, não apenas com o vale-transporte oferecido pelos empregadores para que não tenham desculpas para faltas, isto sim é incentivar a democracia e a cidadania. Vive Joinville!
Fiquei de falar dos defeitos de Joinville, mas ainda que precise me esforçar para encontra-los é uma obrigação moral de qualquer pessoa do Bem fazê-lo. Existem na cidade, shoppings centers que não são exatamente uma referência às nossas tradições, pois lembram em demasia os melhores shoppings de São Paulo. Isto, que muitos poderiam louvar, não é favorável à cidade, pois se um estrangeiro que desembarque em nosso grande aeroporto, tomar um táxi até um desses centros de compra, poderá ter a falsa ideia de que Joinville é igual a qualquer outra cidade próspera da Europa e perderá o interesse em conhecer nossas tantas outras maravilhas.
Nem precisaria falar dos já mundialmente conhecidos adjetivos de Joinville, mas farei apenas brevemente: somos a Cidade dos Príncipes, nossa tradição nobiliárquica é notória, exemplo é nosso nome, oriundo do Príncipe de Joinville, que se não fosse a ignóbil esperteza de Luís Napoleão, teria unificado as casas de Orleans e Bourbon  e sido conduzido ao trono da França;  Cidade das Flores, pois além da tradicional Festa das Flores, em cada casa, em cada praça, em cada recanto da cidade, podemos encontrar os mais belos e floridos jardins;  Cidade das Bicicletas, aqui abundam ciclovias seguras e impecáveis e como nos mais avançados centros europeus, nosso culto povo sabe dar valor aos pequenos prazeres da vida, como uma agradável pedalada às margens do Rio Cachoeira; Manchester Catarinense, como a homônima cidade inglesa, é visível a pujança histórica de nossa portentosa indústria, erguida pelas mãos valorosas dos colonizadores Europeus e mantida com inegável progresso pelos seus descendentes.
Eis um pequeno retrato de Joinville: sejam bem vindos estrangeiros, especialmente do Velho Continente, que poderão ver os frutos das sementes plantadas por nossos ancestrais comuns.   

LM

08/12/2013

Sunday, December 01, 2013

Pequena história canina

Não teve o som de palavras, simplesmente enfiou um tapa na minha cara. Fechei com violência minha mão: com um soco quebro aquele nariz esnobe. Algumas pessoas distribuindo folhetos de religião nos olhavam. Se desse o soco, chamariam a polícia, melhor resolver isso depois.
— Sua puta louca! — Falei entre os dentes, enérgico sem gritar. Os crentes nos vigiavam.
— Você é um cachorro! Um cachorro vadio e sarnento que só me procura quando quer dar um trepada.
— Cachorros vadios só vão atrás de cadelas no cio.
Outro tapa. Desviei, se levasse mais um não iria dar a mínima para os crentes. Se aproximavam, disfarçadamente.
— Se tentar me bater mais uma vez, juro pela virgindade de Nossa Senhora que eu te arrebento aqui mesmo.
— Não fique blasfemando, você nem acredita...
— E você acredita muito mesmo! Só esquece um pouquinho quando tá gemendo e uivando que nem uma cadelinha...
— Cachorro filho da puta! Seu merda!
Xingamentos. Sinal de que estava ficando com tesão.
— Deixa de besteira. Vamos sair daqui antes que aqueles crentes tentem nos converter.
— Você! Eu já frequento a igreja.
— Eu sei, sei que faz tudo direitinho, como manda padre, pastor, bispo, missionário.  É boa esposa, excelente mãe. Só de vez em quando se dá ao direito de aproveitar um quarto de hora, sem fazer mal pra ninguém, só uma relaxada e uma transa bem gostosa com teu cachorro. Uma cerveja. De vez em quando, Deus nem percebe, nem liga.
— Não fala assim de Deus, sabe que acredito.
Perto da praça tinha um hotelzinho, o de sempre. Melhor longe dos olhares santos.
— Vem cá minha cadelinha gostosa.
— Ui! Cachorro filho da puta. Tarado! Vai me deixar de quatro, dar tapas na bunda da tua cadelinha? Ela tá precisando de uma lição. Uma lição bem dura.
— Vou fazer tudo que minha cadelinha gostosa quiser...
— Todo cachorro tem sua cadela.


LM