Sunday, July 22, 2012

O soldadinho de plástico e a bailarina de porcelana: Uma história baseada em fatos reais

Dois engradados de plástico cheios de bonecas, bichinhos de pelúcia, carrinhos, pequenos potes, instrumentos musicais rudimentares e tantas outras quinquilharias são os brinquedos perfeitos da menina que mora na casa verde. Uns emitem sons engraçados, outros, os sons são a menina quem os faz emitirem, há ainda os fofinhos, os engraçados por serem esquisitos e os esquisitos mesmo. Todos preenchem solitárias tardes da menina com alegria, faz de conta e muita magia. É neste cenário lúdico que nossa história se passa, é a história de amor entre o soldadinho de plástico e a bailarina de porcelana.

Ele era, como já ficou claro, um soldadinho de plástico e ela, sem nenhuma dúvida, uma bailarina de porcelana. Ele, um dos tantos brinquedos das caixas, ela um enfeite sobre a cômoda do quarto. A separá-los a imensidão da imobilidade dos brinquedos de plástico e dos bibelôs de porcelana, além da altura praticamente intransponível entre o chão do quarto e o alto da cômoda. Ela, apenas enfeite, dificilmente era requisitada para as brincadeiras, ficava nas suas alturas, observando os contos de fadas e as aventuras de princesas que a menina tramava com os brinquedos das caixas. Chamou-lhe a atenção aquele soldadinho preto, de plástico, querendo fazer pose de valentão, mas com uns olhos tão tristes o que o deixava bem bonitinho.

Às vezes a caixa de desenhos era colocada entre bichinhos de pelúcia e bonecas e a menina espalhava lápis e canetinhas a procura da cor ideal para os mais malucos desenhos. Já o soldadinho, esperava ansioso ser pego pela menina e mais ansioso ainda ficava, esperando ser jogado no chão de forma a poder ficar fitando a bailarina no alto do seu palco. Quando isto acontecia, não perdia a oportunidade de mirar cada detalhe da bailarina, seus olhos negros, sua pele branca, roupas brilhantes e, especialmente, um colarzinho com uma meia lua pendurado no alvo pescocinho. Os dois nunca conversaram, não sabiam um o nome do outro, mas o soldadinho, inspirado pelo colar com a meia lua, em suas fantasias chamava a bailarina de Luana.

Quando a menina recebia a visita de outras crianças, não havia brinquedo que não ficasse espalhado pelo quarto e num desses dias, após as crianças cessarem as brincadeiras, o soldadinho, estendido no chão, ouviu um ruído. Não havia mais crianças ali, apenas os brinquedos. Perguntou quem era.

— Sou eu, o lápis.

— Um lápis? E lápis falam?

— Sim! Não só falo como escrevo lindas histórias com maravilhosas ilustrações.

— E não é nem um pouco modesto. É você mesmo que escreve as histórias?

O soldadinho estava muito surpreso e confuso com a aparição daquela figura magrela e falante. Não que ele nunca tivesse visto um lápis, mas aquele era bem diferente e o lápis continuou.

— Modesto? Apenas falo a real. E vou contar como faço as histórias, é assim: as histórias são feitas com palavras. Não é mesmo? E às vezes, para dar um efeito estético bacana, existem ilustrações nestas histórias. Pois bem, eu sou um fazedor de histórias.

— Acho que estou entendendo. E se você faz as histórias, pode escolher também os personagens?

— Claro!

O lápis que não era bobo nem nada e já havia percebido os olhares compridos do soldadinho em direção à bailarina, percebeu logo onde o bonequinho queria chegar. Então o soldadinho perguntou:

— Será que eu poderia participar de alguma aventura?

— É pra já.

Sem perder tempo o lápis começou a rabiscar no ar seus caracteres mágicos escrevendo e ilustrando uma história de amor. Enquanto dava forma às palavras da história, o lápis desenhou uma escada que ia do chão do quarto até o alto da cômoda onde estava a bailarina. Ao redor dela dispôs flores, árvores, coloridas borboletas e notas musicais. Ao perceber as notas musicais voando com as borboletas, a bailarina começou a dançar enquanto o soldadinho, lá no chão, ficava em pé. Rodopiante e cantarolando uma linda canção, a bailarina desceu as escadas e foi até o soldadinho.

— Oi.

Disse a bailarina enchendo sua pequena fala com um toque musical.

— O oi.

Gaguejou o soldadinho.

— Meu nome é Luana.

— Eu já sabia, sempre soube que não poderia haver outro nome para alguém tão linda quanto a própria Lua.

O soldadinho, se não fosse inteiro preto, teria corado, não sabia como tinha dito palavras tão atrevidas, logo ele, tão tímido e calado. O lápis observava a cena e ria enquanto continuava a escrever sua história. A bailarina pediu para o soldadinho falar alguma coisa sobre ele e, ainda sem entender muito bem como, começou a contar emocionantes aventuras que ele tinha participado. Eram aventuras em florestas distantes, com salvamento de animais das armadilhas de caçadores malvados; histórias de castelos e princesas, fadas e monstros. A bailarina sorria e ouvia as lindas narrativas com muita atenção. Ele continuava sem entender direito o que acontecia, pois desde que saiu da prateleira da loja de brinquedos, nunca saiu daquele quarto e a coisa mais emocionante que tinha lembrança era ficar contemplando a bailarina. Então ele percebeu que não eram suas aquelas histórias, mas do lápis que escrevia e ilustrava as aventuras. O soldadinho voltou a ficar tímido e se entristeceu, pois tinha visto como brilhavam os olhos negros da bailarina enquanto escutava suas narrativas. Sentiu-se como estivesse mentindo para ela, pois não eram aventuras suas.

Sempre atento, o lápis notou a mudança de atitude do soldadinho, que voltou a ficar imóvel como um pedaço de plástico rijo e foi em seu socorro.

— O que foi amiguinho?

— É que eu fiquei tão empolgado com as histórias que nem percebi que eram apenas invenções suas, que nunca vivi estas aventuras.

— Engano seu meu caro soldadinho, eu faço apenas rabiscos, são vocês que fazem as histórias. Vejo seus rostinhos alegres, seus olhinhos cintilantes e ali enxergo as mais espetaculares aventuras que se possa imaginar. As histórias são suas e tem muitas maneiras de viver uma aventura, uma delas é entrando nelas através das histórias.

A bailarina, por natureza mais sonhadora, entendeu logo o que o lápis estava tentando explicar ao soldadinho, de alguma forma ela já sabia que as histórias estavam todas em seus corações e falou:

— Então não vamos perder mais tempo, vamos contar uma linda história com muita magia, danças, aventuras e romance.

O soldadinho se reanimou e eles continuaram a brincar, dançar ao som das melodias desenhadas pelo lápis e a viver as mais espetaculares aventuras.


 

LM

5 comments:

  1. clemair.mendes@gmail9:58 AM

    Que historia mais linda...
    Amei

    Clema

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  2. Anonymous10:37 AM

    arripiei

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  3. Anonymous10:38 AM

    muito linda esta historia. Parabens... mente muito ativa.

    Paulo Lancer

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  4. Replies
    1. Não sei se dá para imprimir direto do blog, mas se me informar um endereço de e-mail posso enviar uma cópia.

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