Sunday, September 18, 2011

Há vagas

Após tantos e muitos currículos enviados a todos os departamentos de RH quantos tivessem em Joinville, Charles Trezinni foi chamado para uma pré-seleção. Muniu-se de suas mais bem elaboradas frases de efeito, banho completo, penteado cheio de gel e roupa de domingo e partiu tal qual o General Athikinsons para a conquista de Monte Nalverdense. A vaga era de repositor para trabalhar em um supermercado. Não parecia muito condizente com sua formação e capacidade, mas no aperto se sujeitaria.

(Repositor

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Repositor é o profissional que trabalha em empresas de varejo, como supermercados, hipermercados e outros tipos de lojas.

Sua função consiste, basicamente, no abastecimento de mercadorias em gôndolas e prateleiras. O profissional da reposição também é um dos responsáveis pela precificação de produtos e controle de validade de produtos perecíveis através do rodízio de produtos.

Este artigo sobre uma profissão é um esboço. Você pode ajudar a Wikipédia expandindo-o.)

    A pré-seleção consistia em uma rápida entrevista, para ver se o sujeito não era retardado e uma prova escrita com grau de dificuldade bastante questionável, para ver se os candidatos eram minimamente alfabetizados. Impetuoso Charles artista irreverente de fina cepa Trezinni maroto dos marotos não se rebaixaria escrevendo bazófias sem botar em evidência toda a sua verve acadêmico-filosófica herdada de anos e anos de estudos cosmológicos da condição humana enquanto ser vivente e pensante possuidor do dom da dominação sobre os demais seres viventes e não viventes e pôs-se a escrever do fundod´almapuradepoetafilósofo para produzir mais um divisor de águas das ciências inexatas.

Fluxo pseudofilosófico acerca dos modelos de trapaçarias

Trapaceio nas orações sussurradas por entre os vão dos dentes quase cariados a mesma trapaça das gargantas-trovões dos donos do poderio. Alheias aos sons das palavras as trapaças camuflam as mentiras das muitas máscaras vendidas nas quermesses de verdades que nem mais camuflam as mentiras embutidas. Não há verdade nas casas honradas assim como não há honra nas negações da verdadeira essência dos baluartes da moral. Mais trapaças a se sobreporem em afirmações efusivas das qualidades em mascarar-me com a maestria dos grandes fingidores. E minhas orações são recebidas nas alturas celestiais pelos santos que embalaram meu terror e minha fé; meu ódio e minha apatia; minha eternidade e minha anemia. Oro também aos homens que derreterão o ouro das minhas moedas dos meus dentes e plantarão o trigo das minhas hóstias sem perguntarem a cor dos meus olhos ou a espessura do meu sangue. Trapaceio as vidas que apresento nos concertos e evidencio as maravilhas da espécie em exibições e vernissages aplaudidas e aprovadas por honrados bastiões da moral. Escrevo sobre flores para não ter que sentir a terra; escrevo sobre os homens para não ter que aspirar seus odores; escrevo sobre a morte para não me acusarem de negar a vida; escrevo sobre a vida para morrer menos a cada dia. Falo de Deus para adiar minha finitude.

O libelo trezinniano caiu nas mãos de um certo José Dias Shulzmamm, chefe dos repositores. José Dias, alma sensível, enxergou-se naquelas palavras. Mandou que trouxessem o impetuoso artista à sua magnânima presença.

— Foste tu quem escreveu estas palavras. E apontou para a folha da prova preenchida por Charles.

— Sim, meu senhor.

Nada mais precisou ser dito e não só Charles Trezinni foi admitido, como ganhou a oportunidade de escolher qual o turno gostaria de trabalhar. Optou pelo horário das duas da tarde às dez da noite, salário de R$ 603,50 mais vale transporte. Os melhores profetas, adivinhos e videntes da cidade já previram: Trezinni se aposentará por tempo de serviço, como repositor, das duas às dez da noite, sendo importunado, de tempos em tempos, pela bursite.

LM

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