Thursday, April 19, 2012

Sobre encerramentos e arte

  1. Após seis anos finalmente a obra estava pronta. Tinha conteúdo, forma, objetivos, suporte iconográfico, enfim, uma lista de designações e adjetivos do mundo da arte e um sentimento a ser absolvido. Pensou em enviar para a galeria, num último instante teve um lampejo suicida e acabou com o que havia de vida na obra. A arte sangrou.


     

  2. Guardou uns tantos segredos nas entrelinhas. Tinha a esperança de que alguém, como ao encontrar na praia uma garrafa atirada ao mar por um náufrago, entendesse seu pedido de socorro. O bilhete naufragou dentro da garrafa.


 

  1. Era moderno, mais, ultracontemporâneo, vanguardista e conceitual, ainda que não soubesse muito bem o significado destes títulos. Sabia de suas criações com tampinhas de garrafa, serragem, limalha de ferro enferrujada, colas, cores encontradas nas sobras de tinta das latas resgatadas do lixo junto com outros parasitas. Falavam-no artista, a dialogar com nomes de pessoas que ele não sabia se existiam e até acreditava mesmo ter conversado com aqueles inexistentes, mas deveria ter esquecido sobre o que falaram. Quando acreditou ser uma celebridade, já não havia lembranças dele nos cadernos descolados: o mundo da arte agora estava apaixonado por um produtor de vídeos experimentais sem imagens.


 

  1. Ela chorou a morte. Ela não era ela, era a personagem, seu choro era cênico e sua vida o roteiro e a plateia um imenso ciclope fixando seu desproporcional olho em seu corpo prestes a ser devorado. Já não sabia quem era ela e quem era a personagem, já não cabia mais o choro e a lágrima, insistia em não sair de cena.


 

LM


 


 


 


 


 


 


 

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