Saturday, July 30, 2011

Falso Ícaro

Um homem vivia em um platô e às vezes ele ia até sua borda para olhar a planície. Ficava pensando como deveria ser bom lá embaixo, mais úmido, quente, cheio de vida. Certo dia, influenciado por um desejo incontrolável, jogou-se lá de cima. Durante a queda pensou que nada melhor do que aquilo poderia existir, o sentimento de liberdade, o vento açoitando-lhe com apaixonante violência, ele parecia um pensamento, livre capaz de qualquer coisa. Quando começou a se aproximar do chão sentiu medo e achou que teria sido melhor sua permanência nas alturas, onde já estava habituado, mas ainda assim ponderou ter valido a pena aqueles instantes mágicos da queda. Já no chão, dolorido até nas idéias, descobriu que o chão da planície, tirando uma ou outra característica geológica, era tão duro quanto o do planalto e para sua decepção, por mais que tentasse pular, alcançava um vôo pouco maior do que um suspiro, jamais poderia repetir a sensação da queda e jamais poderia retornar às alturas. Foi julgado por todos que souberam de sua aventura, uns o condenaram ferozmente por abandonar sua vida para viver uma aventura passageira, outros o reverenciaram como herói por demonstrar tamanha coragem e independência. Alheio aos que o julgavam, procurou não pensar nas conseqüências de seus atos, se teria valido a pena ou não, sua preocupação agora é outra: ouviu falar de um profundo buraco, e hoje passa os dias vagando pela planície a procura deste fosso, para poder precipitar-se, cada vez mais para baixo.

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