Saturday, December 18, 2010

Comecei a escrever este pequeno artigo em 19 de setembro de 2010 e espero estar completamente enganado.

O que vejo diariamente nos jornais e noticiários, por mais que seja uma quantidade considerável de informação, nem sempre se traduz em igual nível de compreensão dos acontecimentos. Consumo notícias e tento decifrar o mínimo possível, se é que esta seja uma tarefa a qual eu esteja preparado, mesmo assim tento entender um pouco do que ocorre com nosso mundo e o pouco que percebo não é animador.
O processo de entrincheiramento dos EUA e dos países da zona do Euro contra as invasões de imigrantes (de raças inferiores?) evidenciam a postura egoísta destas nações, que só toleram a entrada dos pobres, enquanto puderem aproveitar a mão de obra barata para fazerem seus serviços “indignos”. Apesar das fronteiras cada vez mais fechadas, crises financeiras vão sendo sistematicamente escamoteadas sem, no entanto, conseguir uma real vitória. A queda nas produções industriais das tradicionais potências do norte indicam que estes não são fatos isolados, mas uma série de evidências do fracasso do modelo capitalista. Mas o que poderia ser motivo de alegria para os críticos do sistema, soa como um sinal de alerta para conseqüências mais tenebrosas: o que mais poderia impulsionar a produção, dentro do modelo capitalista, em tempos de retraçao do consumo? O que poderia incrementar a indústria até atingir o pleno emprego das forças produtivas? O que poderia cessar a tendência de deslocamento do centro do poder? A mais terrível das respostas: a guerra.
Enquanto a esquerda dá alguns passos tímidos na América Latina, vemos a extrema direita (às vezes fascista) ganhar prestígio e poder em vários países ricos e, a continuar este cenário, Barack Obama, mesmo que consiga a reeleição, dificilmente conseguirá emplacar um sucessor, abrindo caminho para a direita conservadora dos Tea Parties. Só isto já poderia justificar os temores de uma ação militar das potências em busca dos quintais perdidos e qualquer coisa pode servir de pretexto, desde o desmatamento da Amazônia, até a existência de células terroristas ou de narcotraficantes dominando as reservas de água doce.
Mesmo sendo sombria esta previsão (talvez até um tanto exagerada) não há como ignorar que o cenário uma guerra de grandes proporções, a ser desencadeada nos próximos anos, está sendo montado, resta saber exatamente onde o conflito vai acontecer. Oriente Médio, mais precisamente a partir do Irã, talvez Coréia do Norte ou quem sabe, ainda que aparentemente improvável, na América do Sul, por exemplo.
Este meu alarmismo, exagerado para alguns, não se baseia apenas no que acontece atualmente, senão em uma leitura de exemplos que a história nos dá, mais precisamente em um texto de Walter Benjamin, publicado em 1936, A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, onde o autor alertava para a guerra eminente que se estava armando na Europa.

O fascismo pretende organizar as massas sem alterar o regime da propriedade, que as massas tendem, todavia, a rejeitar. Acredita superar essa dificuldade permitindo às massas expressar-se (mas sem reconhecer seus próprios direitos). As massas têm o direito de exigir uma transformação do regime de propriedade; o fascismo quer permitir que se expressem, mas conservando esse regime. O resultado é que tende, naturalmente, a uma estetização da vida política. (p. 252)

Quando vemos que em níveis globais se acentua cada vez mais a concentração de riquezas nas mãos de um número reduzido de pessoas (a parcela mais rica da população mundial, apenas 10%, dispõem de 71% de toda a riqueza do planeta) e vemos os meios de comunicação de massa traçarem um perfil caricato medianizado e padronizado das pessoas (antes, consumidores), em todos os cantos da Terra, não podemos deixar de fazer uma associação com as palavras escritas em 1936, o que as torna sombriamente atuais. E mais sombrios são os seus desdobramentos.

Todos os esforços para estetizar a política culminam num único ponto. Esse ponto é a guerra. A guerra, e tão-somente a guerra, pode fornecer um objetivo aos grandes movimentos de massa, sem entretanto tocar no estatuto da propriedade. É assim que as coisas podem ser traduzidas em linguagem política. Em linguagem técnica, elas serão assim formuladas: só a guerra permite mobilizar todos os meios técnicos de nosso tempo sem nada alterar no regime de propriedade. (p. 252)

Benjamin, por sua vez se utilizava do manifesto de Marinetti, publicado em La Stampa, de Turim, sobre a guerra da Etiópia e sobre este manifesto, o autor esclarecia:

Para ele, a estética da guerra apresenta-se do seguinte modo: quando o uso natural das formas produtivas é paralisado pelo regime da propriedade, o crescimento dos meios técnicos, dos ritmos, das fontes de energia, tende a um uso antinatural. Esse uso antinatural é a guerra, a qual − pelas destruições que traz − demonstra que a sociedade não estava bastante madura para fazer da técnica o seu órgão, que a técnica não estava bastante elaborada para dominar as forças sociais elementares. A guerra imperialista, com suas atrozes características, tem por causa determinante a defasagem entre a existência de poderosos meios de produção e a insuficiência de seu uso para fins produtivos (noutros palavras, o desemprego e ausência de mercados). (p. 253)

Ainda que os EUA e Europa enfrentem uma crise financeira ─ mais pela voracidade de suas elites do que por falta de recursos ─, eles não pretendem diminuir suas riquezas nem abrir mão de sua liberdade de controle sobre o resto do planeta. Além disso, os EUA enfrentam uma crise de identidade enquanto nação dominante provocada pelos fracassos no Afeganistão e no Iraque, além do crescimento econômico da China, entretanto é inegável sua supremacia bélica e sua capacidade de produção e consumo interno, assim como é inegável a capacidade de imposição do padrão American way of life na cultura mundial, derivado do eurocentrismo. Mesmo se considerarmos que os EUA sejam o centro irradiador dos produtos de consumos cultural, o padrão europeu branco e cristão continua sendo o modelo predominante na indústria cultural, assim como ainda é no velho continente onde muitas das grandes fortunas, oriundas da exploração da mão de obra e das riquezas naturais dos países periféricos, vão parar. Estes que também não são fatos isolados, apontam para uma necessidade de reformulação do capitalismo, que talvez os modelos keynesianos de bem estar social não consigam mais responder, restando a opção mais violenta.
Esta guerra será, como a tantas outras, uma guerra imperialista, onde os donos do poder tentarão impor suas vontades em nome dos mais altos ideais humanitários de liberdade e democracia, onde as grandes potências tentarão impor sua supremacia aos que tentarem ousar a questionar as verdades professadas na grande mídia. Diante deste cenário, o que nos resta a fazer? Nós, as massas, temos de nos rebelar contra estes 10% que ditam os rumos do mundo. Há que se negar o modelo que nos é imposto, em que você só é considerado cidadão se for consumidor, onde reproduzimos em escala menor os mesmos modos de dominação e exploração dos grandes capitalistas (qual pequeno burguês-classe-mediano-imitação-patética-dos-ricos nunca explorou a mão de obra barata de uma diarista pobre e negra?). Se o socialismo fracassou, também o capitalismo é um fracasso, pois um sistema que só privilegia uma minoria à custa da miséria de milhões e da destruição dos recursos naturais, não pode ser considerado um exemplo de sucesso.
Enquanto o mínimo de ração nos for ofertado, um pouco das migalhas do luxo dos ricos, outro tanto da falsa ilusão de que as coisas são assim porque são e a descarada ilusão da liberdade, a revolução não eclodirá, pois estaremos muito bem assentados em nossas zonas de conforto, resolvendo nossos grandiosos problemas da prestação do carro novo ou das férias em Florianópolis.

No comments:

Post a Comment